POR MÁRIO INGLESI
Outras máscaras preenchem o nosso cotidiano com seus propósitos
explícitos e implícitos, através do emprego de tempos verbais para indicar
sentidos múltiplos, como o da delicadeza, polidez, ironia, informalidade, em ordens
diversas para anunciar para cada ocasião.
Nesse contexto, há ainda a máscara do
“politicamente correto”, cujo uso permeia a obrigatoriedade, com vistas a
dirimir mazelas e evitar preconceitos inscritos na linguagem do dia a dia. Tal
máscara e seu uso tornaram-se apenas mais uma falácia. Não serve realmente a
seus “bons” propósitos. Por exemplo, a substituição do termo “prostituta” por
“profissional do sexo”, em nada muda a condenação que a sociedade impõe à
atividade que essa pessoa realiza, pois, é a atividade e não o nome que provoca
atitudes de condenação, conforme salientou, Roberto Leiser Baronas, dr. em
Lingüística e Língua Portuguesa, em artigo publicado na revista Língua,
(portuguesa), edição de fevereiro 2011. Há, também, um tipo de máscara usada
para impedir a identificação e preservar o anonimato. É o que ocorria muito em
tempos idos com as cartas anônimas despejando segredos ou confidências que
influíam de modo perverso na vida do indiciado pelo missivista e, hoje, usada
toda vez que se deseja influir destrutivamente na vida de um desafeto, por
egoísmo, inveja, birra ou pura maldade, ou brincadeira de mal gosto através do
“anonimato”, cuja modalidade, hoje, campeia em larga escala na internet e nas
redes sociais, escondendo quem realmente somos e o que pensamos, talvez por
pejo ou para não nos comprometermos naquilo que dizemos e opinamos. Mas,
contrariamente, também usamos o anonimato para nos opor à exposição, à
identificação, principalmente hoje, quando a exposição e identificação são
procedimentos usualmente banais e corriqueiros e, já de má reputação, dada a
sua frequência e inocuidade.
O anonimato atinge o universo dos profissionais
especializados que alugam sua escrita e ideias em favor de terceiros, os “ghost
writters”, os denominados escritores fantasmas, objeto do romance Budapeste, de
Chico Buarque de Holanda. Com isso, a máscara atinge o plano físico e das ideias
para crédito de autoria a outrem: os autobiografados, os ensaístas ou os
candidatos a teses de mestrado ou doutorado.
De modo diferente, mas também com a máscara do
anonimato em favor da divulgação, promoção e propaganda, os “covers” musicais
apelam para o travestimento geral e integral de grandes ídolos, da musica pop
ou não, sem nenhum constrangimento, mas com a plena satisfação de estarem
promovendo os seus ídolos e suas performances musicais.
Como se nota, o uso da máscara perpassa toda nossa
vida, de um modo ou de outro, em situações múltiplas, as mais inusitadas e as
mais diversas, a nosso bel prazer ou de acordo com cada circunstância que se
nos apresenta. Uma reflexão sobre elas só
quando no fundo de nós mesmos, na mais íntima solidão de nossa loucura,
buscamos aos gritos os porquês do uso de tais máscaras.
A máscara mais em voga e conhecida hoje em dia, e,
mais bufa da comédia pública, envolve altos e médios escalões da República. Ela
prima por sua inusitada mutação constante, sempre de acordo com as situações,
mas plena de efusivas maquiagens e salamaleques palavrosos que acompanham, seus
portadores, como: Vossa Excelência, Excelentíssimo, no afã de marcar a honra do
mandato, do respectivo partido, bem como as tradições, a pátria e seu
eleitorado, numa carreira intrincada, mas cheia de brilharecos que os açodam
convenientemente com mesuras e teatralidade sem fim, o mascarar sem limites.
Tal máscara é trançada com finos fios de hipocrisia,
de inverdades, de indignidade, fleugma patriótica mistificadora e mais que tudo
isso, ornadas de miçangas e lantejoulas coloridas, fazem de seus portadores
verdadeiros mistificadores da pátria amada idolatrada, causadores de grandes
constrangimentos ou de não poucas gargalhadas, quando de suas performances
inusitadas por seus usuários no Gran Circo de Pindorama.
A única particularidade dessa máscara advém do fato de
ela não precisar de tratamentos ou cirurgias médicas para removê-las ou
curá-las de seus malefícios em favor dos seus usuários. Pois qualquer
providência depende unicamente de nós, seus espectadores, na hora de
escolhê-los a cargos eletivos e, de acompanhar seus desempenhos durante a
atuação de seus mandatos. Caso contrário, só teremos “ilusões perdidas e sonhos
vendidos, como bem proclamou Cazuza (1958-1990) na letra de “Ideologia”:
Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato
Que eu nem acredito
Ah! eu nem acredito
Pois aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro…
Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia! Pra viver…
Portanto, é preciso muito cuidado ao lidar com tal
máscara, pois há sempre a possibilidade de travesti-la em todos os demais
personagens de idêntica função. Isso acarretará um descrédito tal, que poderá
alçar qualquer político ou não a apresentar-se como salvador da Pátria e
insuflar a necessidade de leis de exceção, e com elas adeus o Estado de direito,
as liberdades de expressão, e de pensamento. Adeus à democracia. É o alçar ao
grau supremo, a máscara ditatorial, com sua feição horrenda, tecida com fios
rotos do nacionalismo, da demagogia e do populismo.
Como se percebe, a máscara, além de simples adereço, reflete
também sentimentos, atitudes, e modalidades infinitas da síntese humana e sua
passagem pelo planeta Terra.
Começa logo ao nascer. A criança, com seu rosto
avermelhado e ainda com as sujidades do parto, faz o seu primeiro choro, com as
palmadas que logo recebe ao vir ao mundo.
Depois, a máscara se torna sua identidade e com o
choro intermitente, por alimento, sua comunicação imediata e única. Com o
crescimento, vêm as máscaras das birras, da chantagem emocional e por aí vai pelos
primeiros tempos, do engatinhar até os primeiros passos titubeantes.
Continua...
Nenhum comentário:
Postar um comentário