domingo, 4 de setembro de 2011

DOIS SAPOS


Fragmento do livro “De alma para alma” – Huberto Rohden

Vivia um sapo – no fundo dum poço. Lá nascera, lá vivera, de lá nunca saíra – e lá esperava morrer. O seu horizonte era de um metro e meio de largura – o diâmetro do poço. A profundidade de sua vida era de três palmos – como as águas do poço. Para além da borda do poço – nada mais existia para ele…
Certo dia, tombou no fundo do poço – um sapo de outras regiões. Vinha de longe, de muito longe – das praias do mar… Com secreto rancor, viu o primeiro invadido pelo segundo o seu espaço vital. Mas, como o segundo era mais forte, resolveu o primeiro não o guerrear – e limitar-se à defesa passiva…
Depois de três dias de silêncio recíproco, travou-se entre os dois batráquios o diálogo seguinte:
- Donde vens tu, estranho invasor?
- Das praias do mar, ignoto ermitão.
- Que coisa é o mar?
- O mar?… O mar é uma grande planície d’água.
- Tão grande como esta pedra em que pousam minhas pernas gentis?
- Muito maior.
- Tão grande como esta água que reflete o meu corpo esbelto?
- Maior, muitíssimo maior.
- Tão grande como este poço, minha casa?
- Mil vezes maior. Milhares de poços destes caberiam no mar que eu vi. O mar é tão grande que sempre começa lá onde acaba. É tão grande que todo o céu cabe nele, e ainda sobra mar. Todos os sapos do mundo, pulando a vida inteira, não chegariam ao outro lado – tão grande é o mar à cuja margem nasci e vivi.
- Safa-te daqui, mentiroso! – exclamou o batráquio do poço. – Coisa maior que este poço não pode haver! Mais água que esta água é mentira!…
Desde então viviam os dois em pé de guerra, no fundo do poço. Não diz a história se algum deles, super-sapo, venceu nessa luta feroz… Nem diz se um deles, batráquio genial, convenceu o outro da verdade das suas idéias…
Consta apenas que, desde esse tempo, vivem no mundo seres que só crêem em si mesmos… Seres que sabem tudo o que os outros ignoram… Seres que tacham de loucos os que afirmam o que eles não compreendem… Seres de tão vasto saber que consideram desdouro aprender…
Não fales, meu amigo, em mares – a quem mares não viu! Deixa viver no poço – quem no poço nasceu! Horizonte de metro e meio, água de três palmos de fundo, pedra de meio palmo – que mais querer o batráquio dum poço?
Deixa ao ignorante a sua feliz ignorância! Não fales em mares a quem para um poço nasceu!
Cada qual com seu igual…

5 comentários:

  1. Será ?cada qual com seu igual! Ou fazer o tal que vive no poço mais consciênte da verdade que o outro viveu!Acho que o errado ou ignorante deve ser ensinado e até levar um puxão de orelha( mas em particular), deve ser orientado!Se aceitar voce ganhará um amigo, caso contrário , chame mais dois sapos como testemunhas e Oriente de novo, se foi aceito, ÓTIMO, se não, sua missão foi cumprida.assim esgotamos todos os esforços para tentar trazer LUZ , onde há trevas!Que bela estória para pensar- mos sobre ela.Um grande abraço Dr.Ricardo.

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  2. Creio que existam três maneiras básicas de realizar este processo que chamamos Vida. A Experiência, a Imitação e a Meditação. Costumamos ir pela Experiência, só sentindo “na pele”, reconhecemos. Às vezes vamos pela Imitação, quando sentimos Admiração por alguém ou algo. A mais sutil, a Meditação, que acredito vem do coração.
    Deus me livre de sequer sentir impulso pela mais básica, a Experiência. Se pelos menos os sapos se guiassem pela Meditação do coração, poderiam descobrir juntos, e se ajudando mutuamente, uma solução para sair da situação cristalizada para um e limitadora para o outro, do fundo do poço!

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  3. Bem...
    Eu creio que tal trecho concorde mais com Thoreau quando em Walden, ele cita que muitas pessoas muito inteligentes parecem doidas mediante as demais, pois ela possiu 2/3 de inteligencia e as demais 1/3 que não corresponde a mesma parte dos outros 2/3, o que torna tal convivencia incompativel.
    Creio que os sapos devam acordar para conhecer o mar, mas entendo que a 'busca pelo litoral' tem que ser algo interior com alguns momentos de dificuldade pra descer a serra, kkk.
    Eu gosto dos sapinhos, pois interpreto algo cada um a seu tempo, rs...
    Valeu pela reflexão. Um abraço Ric.
    Mayra Lopes.

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  4. Que bela história Ricardo.
    Muitos animais, conseguem ser melhor que o homem.
    Somos seres pensantes, com inteligência, mas teimamos agir na ignorância, principalmente quando tentamos nos iludir em mudar o outro. Tem um ditado que diz quem procura acha, mas quem está feliz assim...não espera nada.
    Bom cada qual com seu igual, seria um tormento inimigos viverem juntos.
    Penso que podemos ser apenas exemplo, nos doar aos outros, sem esperar nada em troca.
    Se achar que não está bom assim, mude.
    Abraço.

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  5. Existem muitas maneiras que podemos interpretar essa história por exemplo as pessoas que se fecham no seu mundo perde a oportunidade de obter novos conhecimentos porém não aceita quando aparece no seu espaço um outro ser mostrando que existem outras coisas que também podem ser compartilhada.
    Abraços.

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