segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

BOAS INTENÇÕES


POR MÁRIO INGLESI

SOBRE:  http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/11/o-estranho.html




Dr. Ricardo

Talvez seja preciso chamar os órgãos de segurança. O tal autor desconhecido, ataca novamente, usando, é certo, armas envelhecidas, mas ainda de certa periculosidade, uma vez que apontadas para nossos aparelhos de entretenimento, de uso frequente, e, impossíveis de serem descartados, a não ser por outros mais novos, mais potentes e com recursos de última geração.

Para dizer o mínimo, desculpem-me  seus leitores, mas o texto é raso, cheio de boas intenções, mas de pouca reflexão. Ora, talvez o autor não saiba, mas de boas intenções o mundo está cheio – podemos dizer até, sobrecarregado em demasia. Não passa disso, boas intenções. E pior, envelhecidas, retrógradas e inócuas.

Em pleno século XXI, falar mal da televisão, de seus efeitos deletérios e deseducadores, e ainda, estender tal falação a outros aparelhos - de implantação ainda recente, mas de alcance fabuloso para a melhoria de nossa vida e de nossa comunicação, é sem dúvida manifestar-se como um “natimorto”, de quem ficamos condoídos de sua situação, vertendo talvez algumas lágrimas, apenas isso, pois nada há que fazer. É assunto encerrado.

Para isso não acontecer seria preciso fazer-se antes um bom pré-natal, providenciar a ingestão de comida realmente saudável, e tantas outras medidas que favoreceriam não só um bom parto como um nascimento adequado, e sempre esperado.

Mas, no caso, é certo que exageraram em tudo. E, o que é pior, vendo a vida apenas através de lentes inadequadas, que desfiguram tudo que vêem. E, mais, fazem prejulgamentos apressados e, na maioria das vezes, maléficos e inapropriados no tempo e no espaço esquecidos, obviamente, de que “a perfeição é tão somente uma meta.” E mais, se há correções a serem feitas, que se façam, e não apenas condenem o que está feito ou sendo feito.

É preciso compreender – e sempre - que se há males – é preciso denunciá-los, para saná-los, mas, atacando a esmo, sem precisão do alvo a ser realmente atingido manifesta-se fator improdutivo.

É preciso ter em mente que muitos dos males que pululam por tais aparelhos de comunicação e ganham status, correm por nossa falta de discernimento na escolha do que precisamos e devemos ver, fazer ou, acolher.

Coisas boas, mesmo no campo do entretenimento, há,  e muitas.  Às vezes, não são melhores por certas injunções econômicas e comerciais, que não ousamos atacar. Além disso, há o célebre controle remoto, o botão de desligar. Existem, ainda, as TVs por assinatura, a internet, e tantos outros modos para valer-se de entretenimento, poupando o cérebro a espaços vazios para coisas saudáveis e de melhor serventia.

É preciso também convir, que toda a parafernália de aparelhos que nos cercam vieram para ficar e, sem dúvida, serão aperfeiçoados ou substituídos por outros ainda mais potentes e de última geração, sempre em  favor do nosso lazer, entretenimento e, mais ainda, em favor das  facilidades  de melhoria de vida, trabalho e usufruto.   

Outro aspecto que chama atenção no texto é a preocupação pueril com os palavrões. Eta coisa mais démodé. Os palavrões fazem parte da vida cotidiana do povo, e mais, hoje em dia, eles perderam até o estigma de fealdade em pronunciá-los, assim como o senso pejorativo que o abarcava. Hoje, tornou-se palavra corriqueira configurada em dicionários e enciclopédias e dita em todos os lugares e em todas as rodas, sem quaisquer vislumbres ofensivos.

Portanto, caro ilustre desconhecido, que tal por os pés no chão e olhar ao seu redor sem os atropelos presunçosos eivados de preconceitos – estes sim maléficos e perpassados de ignomínia, que as futuras gerações, sem dúvida, tudo farão por ignorar, felizmente.

Mário Inglesi

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

EXERCÍCIO DE SER CRIANÇA


PELO MESTRE: MANOEL DE BARROS


 Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira
Era o mesmo que roubar um vento e sair correndo
com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo
que catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos
A mãe reparou que o menino gostava
mais do vazio do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo aquele menino que era cismado e esquisito
Porque gostava de carregar água na peneira
Com o tempo descobriu que escrever
seria o mesmo que carregar água na peneira.
No escrever o menino viu que era capaz
de ser noviça, monge ou mendigo ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro
botando ponto final na frase.
Foi capaz de modificar a tarde
botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor



segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

LUZ NA VARANDA


POR: DULCE MORON



Luz que dá gosto ver
sem que a sombra
assombre.
 
Nuvens cinzas, cor de chumbo,
caminham lentas para o oeste.
 
Vento manso no cimo das árvores
finda a tarde no voo lento.

Muitas antenas eretas apontam o céu,
lugar calmo, de contaminar a gente.
 
Logo abaixo, nos prédios muitos,
inúmeras janelas abertas ou fechadas.
Varandas voltadas para tantas outras.
 
Céu e solo.
Pessoas, nenhuma.
Só revoam em aviões.
 
Hora do banho ou do jantar.
Horizonte desenha dentes.
Horário de verão a esperar.

Semicírculo distante de mais prédios
pequeninos nesta linha longe
onde a terra encontra o céu.
 
Ainda há luz no oeste
sobre mar de nuvens leves,
rubras a vagar.

Imagino aromas:
Manjericão, alecrim,
rosas e jasmim.

Sinto e logo penso
Vejo e logo sinto
Sinto e logo crio

Escrevo
sem ponto
final

Em 14/11/2012, Dulce

sábado, 1 de dezembro de 2012

SOBRE VIVER E MORRER COM SAÚDE VI

POR MÁRIO INGLESI - "A ALEGRE SORRATEIRA" VI - CONTINUAÇÃO DE:


http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/09/a-alegre-sorrateira-i-viver-com-saude.html
http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/09/sobre-viver-e-morrer-com-saude-ii.html
http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/10/a-alegre-sorrateira-iii-viver-com-saude.html
http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/10/sobre-viver-e-morrer-com-saude-iv.html
http://saudeconsciencia.blogspot.com.br/2012/11/sobre-viver-e-morrer-com-saude-v.html


O sétimo selo - diálogo de Antonius Block com a Morte

 

Entretanto, se porventura, a morte, sob qualquer circunstância é causadora de medo, náuseas, ou mal estar, se não se deseja nem ouvir falar dela, pois simbolizam, tal como as figuras literárias dos “vampiros” (Drácula, Nosferatu, Frankenstein et caterva), o desejo, a morte, a imortalidade, não é preciso esconder-se, ou fechar os olhos, ou virar a cabeça para o outro lado, procure lembrar-se de que tais atitudes são inoperantes, cujo teor revelam apenas reverência e resignação – valores religiosos, cujas atitudes explícitas apontam para o poema-prosa de Mário Quintana:

O Bicho
Quando quer fugir dos outros,
Faz um buraco na terra.
O Homem
Para fugir de si
Fez um buraco no céu.
(“As Covas”, de Mário Quintana in “A Vaca e o Hipogrifo,” ed. Círculo do Livro, 1972).

Se isto, não o acomodar, procure assistir à série, de TV paga, “A Sete Palmos” ou algum filme do José Mojica Marins (o Zé do Caixão), onde brinca com a simbologia céu e inferno, ou ainda, veja o seu programa semanal na TV paga (Canal Brasil) e deixe os seus medos e seus desconfortos com a morte, de lado.  Ou então, derrame sua tristeza, lendo, serenamente, porém, com o coração bem aberto, e receptivo à dor, os sonetos:

Alma minha gentil que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste

(in Sonetos de Camões, Edição Saraiva, 1955).

ou ainda:

Querida ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro
(“À Carolina” Poesias Completas, - Machado de Assis, Ed.W.M. Jacson, 1953).

É preciso lembrar-se que a intermitência do correr da morte, durante a nossa vida, é fato do qual não dá para se fugir ou se esconder, ela é companheira contumaz. Em assim sendo, o melhor é encará-la, compreendê-la e, uma vez aceita, saber lidar com ela, seja no âmbito familiar, dos amigos, ou na profissão, em que ela é useira e vezeira, como, na medicina, na enfermagem, e outras afins. Que o diga, aliás, o Dr. Dráuzio Varella, médico oncologista, que retratou, de maneira bastante delicada, sem perder a fleugma sentimental da dor, mas com comedimento e vasta carga humana, os casos de morte que perfazem o conteúdo de seu livro “Por Um Fio”, no qual faz desfilar afetos e mistérios que só a morte próxima proporciona por ocasião da agonia e, quiçá, da glória, de seus escolhidos.


Biutiful - A vida por um fio

Em assim fazendo, poderá erigi-la, sem medo, sem constrangimento, ou maiores sofrimentos, como nossa mais fiel companheira e parceira em nossa vida terrena, pois é manifestamente incompreensível apenas o desejo a que muitos são levados por morrer.
 Eis aí – valha-me Deus! Que aflição!  A floração que o tema da morte, - ah! Sempre a morte! A nos atingir dentro e fora de nós mesmos - felizmente, me faz surtir, como as “chaves de casa” para abrir as portas e escancarar as janelas sempre e cada vez mais, em favor da vida, e sua preservação, queiramos ou não, com o objetivo concreto, satisfatório e primordial de não ver a morte minimamente alvissareira e vitoriosa, ainda que, de todo modo: “Viver não é passear por um jardim” (in Boris Pasternak (1890-1960) é preciso com John Donne declarar:

Oh! Morte, que alguns dizem assombrosa
E forte, não te orgulhes, não é assim;
Mesmo aquele que visastes o fim,
Não morre, não te vejo vitoriosa.
Vens em sono e repouso disfarçada,
Prazeres para os quais tu surpreendes;
E o bom ao conhecer o que pretendes
Descansa o corpo, a alma libertada.

Serves aos reis, ao azar e às agonias,
A ti, doença e guerra se acasalam;
Também os ópios e magias nos embalam,
Como o sono. De que te vanglorias?
Um breve sono que a vida eterna traz,
Golpeia a morte e Morte morrerás.
(John Donne (1572-1631) in “Holy Sonnets” (Sonetos Sagrados, 1615), cujo poema acima foi traduzido por José Almino, publicado na FSP –Mais!, pág. 32, em 05 março 2000).