sexta-feira, 16 de setembro de 2011

SIMETRIA - UM POUCO MAIS


(M. Escher)


POR MARIO INGLESI

Dr. Ricardo

Em tempos não muito remotos, fomos formados – e isso em bases bastante sólidas e eficientes – no conteúdo de que o conhecimento científico era o motor primeiro do conhecimento existencial ou, a maneira de preenchê-lo, eficazmente.
Desse modo, o sagrado era recorrente apenas de crença e de efeito, só para situações aflitivas ou incontornáveis. Fora isso, não havia quaisquer outros questionamentos sobre a vida, o universo.
Esse panorama só veio a ser modificado com a eclosão das duas guerras mundiais, as quais abalaram os alicerces da sociedade e suas crenças, pondo por terra tudo o que se imaginava eterno e definitivo. Tudo, então passou a ser questionável.
Em meados ou fins do século 20, de modo quase às escondidas e sem muito alarde, veio à tona um novo olhar, ainda que tênue, mas duradouro, embora ainda em andamento sobre a reaproximação da ciência para com o sagrado, formando uma simetria, em busca de um processo de consciência e significado existencial, que abarca inclusive a saúde.
Em uma breve panorâmica sobre o assunto, não nos ocorre ainda, nesse processo, indícios cabais em favor de resultados desse novo olhar. Todavia, não se deve desmerecer a formação dessa simetria, assim como seus possíveis resultados. Mas de todo modo, “Navegar é preciso; viver não é preciso.” (F. Pessoa, in Pórtico)
É evidente, que a força da realidade a que estamos vivenciando, não oferece muito espaço em favor desse conhecimento. O que se busca, com certa presteza, são as providências imediatas relativas a um existencial condigno, e satisfatório.
Mas, de todo modo, navegar “por mares nunca dantes navegados”, (Camões) é ir em busca da sabedoria, de conhecimentos, de  novos aprendizados  dos mistérios mais profundos do ser humano, é singrar por outros mares, novos horizontes, é  encantar-se e maravilhar-se com novos paraísos, novas gentes e outros questionamentos. Mesmo que nada disso aconteça, a aventura sempre trará novos desafios, outras tensões, outros temores e novos ou talvez novíssimos amores.
Por conseguinte, também, é preciso lembrar que, hoje em dia, - convenhamos - o ser humano, em geral, tratando-se de aculturação, foge em disparada, de pensamentos mais profundos, mais equidistantes da realidade, imediata. Deixando isso, comumente, para os “mais entendidos”, os acadêmicos, os intelectuais - estes últimos vistos sempre pejorativamente. O imediatismo, a simplicidade, o terra a terra, é o que precisa predominar – pensa, infelizmente, a maioria, seja em que situação for, principalmente se comportar previsões comportamentais, descobertas, estímulos, diversidade, harmonia, aperfeiçoamento, etc. etc. Enfim, age como espelho:

“O Espelho reflete certo; não erra porque não pensa
Pensar é essencialmente errar.
Errar é essencialmente estar cego e surdo” (*)

Ademais, o ser humano, em sua plenitude, almeja sempre se indispor a sistemas organizados, a parâmetros, a formas fixas, sejam eles quais forem, tais como as simples regras ou formas existentes ou não no mundo natural. Em se tratando da Simetria, então, ele procedeu a uma verdadeira varredura em campos os mais diversos, principalmente no das artes (o balé, o teatro, o cinema e fotografia, a arquitetura, etc.etc.). No seu dia a dia, quando a simetria se configura, ela é mal vista, e pejorativamente denominada de kitsch, como quadros ou plantas dispostos simetricamente, em ambientes os mais diversos.
Assim, o caos apesar de configurar todas as possibilidades, inclusive a simetria, esta, está longe de configurar qualquer predomínio – como, aliás, inversamente acontece no mundo natural e no ser humano, como parte desse mundo.
Em todo esse arcabouço, o que deve prevalecer, de modo geral, é o maior grau de liberdade de escolha à efetivação ou não do sagrado na vida existencial, para, assim, afastarmos descriminações inócuas e impositivas, como já aconteceram em épocas remotas e que, infelizmente, embora em menor grau, ainda hoje vigoram (a exemplo da visão que ainda se tem dos ateus, agnósticos, dos judeus, dos muçulmanos, dos pobres e desvalidos, dos negros, dos imigrantes etc. etc.)
Com isso, é de se acreditar, que a simetria entre ciência e o sagrado poderá trazer bons frutos no decorrer deste século, em prol da saúde e do desenvolvimento humano.
Se este for o destino – ótimo! – valerá dizer com Paulo Leminski:

“com o destino
o que pintar
eu assino”(**)

É isso. Caro amigo: “Navegar é preciso” sempre, cada vez para mais longe ou mar adentro, Porém com a curiosidade do aprendiz e com o desejo e o cuidado do aprendizado, tal como no poema “Catar Feijão” de João Cabral de Melo Neto:

Catar feijão se limita com escrever:
jogam-se os grãos na água do alguidar
e depois, joga-se fora o que boiar
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.
2
Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão mastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras;
a pedra dá à frase seu grão mais vivo;
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a com o risco.

(*) Poemas Completos de Alberto Caeiro I\(F. Pessoa)
(**) Poesia Jovem Anos 70  (Paulo Leminski )

Com esses pensamentos soltos, o abraço fraternal costumeiro e sempre afetuoso.

Mário Inglesi 07/09/2011

4 comentários:

  1. Lindo!parabéns.A ciência e o sagrado são caminhos relativos na busca da verdade...e do sentido da vida!Essa simetria , tão bem esclarecida , é sem dúvida, muito nescessárias no alcance e na busca do ideal."Nada é absoluto, tudo é relativo"-Einstein -Navegar é preciso!sonhar e ter ilusões, mais ainda!e , sem medo de possíveis pedrinhas...

    ResponderExcluir
  2. Lindo demais onde se descreve a verdade.

    ResponderExcluir
  3. Adorei anjo da guarda.
    Mostra o verdadeiro caminho
    Michele!

    ResponderExcluir