POR MÁRIO INGLESI
Dr.
Ricardo
Em todas as civilizações, desde as mais remotas, as
máscaras, como adereço ou não, fizeram parte da humanidade. Em princípio,
talvez nos rituais, depois, nas artes cênicas, como nas tragédias gregas, para
demarcar o drama, ou na Comédia Del’Arte, com as figuras do Pierrô, Colombina e
Arlequim, para surtir o riso e o melodrama. As máscaras configuram também os
palhaços, os clowns, como ainda, nas HQs, os seus inúmeros heróis com o
objetivo de esconder-lhes a verdadeira identidade. Enfim, as máscaras como
adereço, sempre se fizeram presentes, quer nos momentos de alegria, como nos
bailes de máscaras, nas festas carnavalescas, e em suas marchinhas, ou nos
momentos da finitude do ser humano, através das máscaras mortuárias, feitas
como a última imagem a ser guardada como lembrança do momento final da
existência. Ou ainda, as máscaras para disfarçar a verdadeira imagem do usuário
delas, em momentos ou ocasiões especiais ou propícias. Estas tanto podem ser um
adereço, como ainda um disfarce em pintura de cores vivas, distribuída em
traços marcantes pela face ou até mesmo no corpo do usuário para definir-lhe o
uso em momentos especiais, de danças, oferendas, ritos de morte etc. etc., como
ocorreu e ainda miudamente ocorre nas comunidades indígenas ou aborígenes, de
todos os cantos do planeta.
Mas, não para por aí. O uso da máscara ou a sua
figuração, percorre todas as artes cênicas e livros destinados ao público
infanto-juvenil, mormente para a mimetização de animais e de seu animismo.
Apesar de todos esses tipos de máscaras e seu uso, o
homem, em sua metamorfose ambulante, viu-se compungido ou mesmo constrangido,
por injunções próprias ou alheias, em seu dia a dia, nas suas relações
domésticas, de trabalho ou, simplesmente na convivência comum corriqueira, a inventar,
usar e usufruir em seu próprio benefício ou de outrem, outras máscaras, desta
feita, interiorizadas e entranhadas pelo uso, para serem exteriorizadas em cada
momento oportuno, fazendo de si uma multiplicidade de seres outros, sem
identidade própria, que o defina e o configure como ser de personalidade e
características únicas. Isto o torna manipulador e manipulável, em sentimentos,
idéias, gestos e manifestações díspares, de toda ordem, quer por escrito ou, oralmente.
Essas máscaras podem se configurar em: egoísmo,
quando seu portador não parte nem reparte e quando o faz sempre briga pela
melhor parte; em: bajulação, para angariar favores, cargos, obséquios a seu
favor, seja ou não em detrimento de outrem; hipocrisia, em prol de parecer aos
outros o que realmente não é, no intuito de sempre enganar, dissimular, falsear,
etc.; superioridade, para mostrar-se, estar por cima e acachapar outrem,
induzindo a preconceitos de toda ordem; covardia, ao aproveitar-se de fraquezas
alheias; puritanismo, moralismo e tantos outros “ismos” que veem mazelas em
todos, mas não em si mesmos; corrupção para tirar ou acobertar proveitos;
inveja de outrem, por coisas ou motivos supérfluos; vaidade, alimentada pela
indústria e comércio.
Essas configurações são apenas algumas de tantas e
tantas outras que o ser humano veste e desveste e traveste ao bel prazer, ao
aprazado da hora, ao demarcado e ocasional do lugar e, sempre com vistas à
satisfação e interesses pessoais múltiplos. Elas têm como vantagem principal, a
de poderem ser manipuladas para mutações imediatistas, de acordo com as
convenções do usuário, a exemplo do poema “Sociedade”, de Drummond:
Sociedade
O homem disse para o amigo:
- Breve irei a tua casa
e levarei minha mulher
O amigo enfeitou a casa
e quando o homem chegou com a mulher,
soltou uma dúzia de foguetes.
O homem comeu e bebeu.
A mulher bebeu e comeu.
Os dois dançaram.
O amigo estava muito satisfeito.
Quando foi hora de sair,
o amigo disse para o homem:
- Breve irei a tua casa.
E apertou a mão dos dois.
No caminho o homem resmungava:
- Ora essa, era o que faltava.
E a mulher ajuntara: - Que idiota.
- A casa é um ninho de pulgas.
- Reparaste o bife queimado?
O piano ruim e a comida pouca.
E todas as quintas-feiras
Eles voltam à casa do amigo
que ainda não pôde retribuir a visita.
Diferentemente das máscaras objeto do texto do
pensador Khalil Gibran, elas não caem ou são roubadas à luz do sol, nem o seu
usuário será tomado por louco, e terá liberdade e segurança em sua loucura. Ao
contrário, chamam-no, com altivez, e com certa inveja, de ESPERTO e, na maioria
das vezes, o aclamam com palmas e muito bis, como heróis da modernidade e da
nossa gente: os VENCEDORES.
Assim, se as lágrimas se espalham pelo nosso rosto de
ver “triunfar tantas nulidades”, (Rui Barbosa) tanta incongruência, um riso,
ainda que acanhado, desabrocha em nossos lábios de ver tamanha carnavalização
em bloco de mascarados.
Esquecidos que todos nós estamos no mesmo universo, e,
portanto, que nossos problemas e anseios são de resolução comuns, só nos resta
tentar nos desfazermos minimamente dessas máscaras inoportunas e incongruentes,
o quanto antes, para alcançarmos uma vida digna de ser vivida.
Pode ser uma tarefa inglória. Mas uma tentativa sempre
é viável e válida, ainda que nós mesmos nos chamemos de “loucos”, ou outros nos
achincalhem com seus ditos e impropérios.
Continua...
Só posso dizer uma coisa: toda vez que cai uma máscara meu coração se parte, a decepção chega.
ResponderExcluirO problema é que ainda não inventaram uma cola pra colar as máscaras.
As máscaras tem sido mais agradáveis que as faces assustadoras que escondem.
Não sei se o mundo é suportável sem máscaras. Mesmo porque elas dão a beleza que as faces não possuem, dão a esperança de que exista em algum lugar aquela fisionomia.
É isso...
Acredito que a solução está no fato de não terem inventado cola para colar as máscaras! Usa máscara aquele que não tem preparo para ser o Ser que habita sua essência, aquele que prefere seguir o fluxo ao invés de encontrar seu próprio caminho, aquele que escolhe a escravidão e renuncia à liberdade, aquele que tem medo do ostracismo, aquele que foge da verdade e da missão que somente ele e mais ninguém tem o dever de cumprir.
ResponderExcluirBoa noite!
ResponderExcluirA máscara usada como adereço, rituais, danças, festas , outros é aceita com tal propósito.
Mas o homem com sua inteligência, aproveita a ocasião para se manifestar de maneiras diversas. Buscando sempre pelo exterior, consegue enganar , manipular e muitas vezes alcança seu objetivo. Acontece também as vezes, em que a máscara se torna tão real,que a ilusão da máscara se torna real, e o real ilusão. E ai a perda está completa. Mas acontece também, que podemos colocar a máscara no outro, negando uma realidade presente que não aceitamos.
Pois o ser autêntico, as vezes assusta, neste mundo tão ilusório, mas acredito que a autenticidade faz parte da plenitude.
Cara Luisa
ResponderExcluirAdorei essa sua colocação sobre a máscara que se coloca no outro, para conseguir aceitá-lo. Ótimo! Quantas vezes não ouvimos dizer: "ruim com ele, pior sem ele"... Triste né?
Beijão.