Jacques Prévert – Tradução - Carlos Drummond de
Andrade
Pinte primeiro uma gaiola com a porta aberta.
Em seguida pinte alguma coisa graciosa,
alguma coisa simples, alguma coisa bonita, alguma coisa útil...
ao pássaro.
Depois, coloque a tela contra uma árvore
Em seguida pinte alguma coisa graciosa,
alguma coisa simples, alguma coisa bonita, alguma coisa útil...
ao pássaro.
Depois, coloque a tela contra uma árvore
no jardim, no bosque ou na floresta
e esconda-se atrás da árvore sem dizer nada, sem se mexer.
Às vezes o pássaro chega logo,
mas pode levar muitos, muitos anos
até se resolver.
Não desanime,
espere.
Espere, se preciso, durante anos.
A velocidade ou a lentidão da chegada
do pássaro, não tem a menor relação
com a qualidade da pintura.
Quando ele chegar
(se chegar)
mantenha o mais profundo silêncio,
espere que ele entre na gaiola.
Depois que entrar,
feche lentamente a porta com o pincel.
Aí então apague uma por uma todas as varetas.
(Cuidado para não esbarrar em nenhuma pena do pássaro.)
Finalmente pinte a árvore, reservando o mais belo de seus ramos
ao pássaro.
Pinte também a verde folhagem e a doçura do vento,
a poeira do sol, o rumorejo dos bichinhos da relva no calor da estação.
Depois aguarde que o pássaro se decida a cantar.
Se ele não cantar,
e esconda-se atrás da árvore sem dizer nada, sem se mexer.
Às vezes o pássaro chega logo,
mas pode levar muitos, muitos anos
até se resolver.
"Pássaro de dia" por Ana Alice Francisquetti |
Não desanime,
espere.
Espere, se preciso, durante anos.
A velocidade ou a lentidão da chegada
do pássaro, não tem a menor relação
com a qualidade da pintura.
Quando ele chegar
(se chegar)
mantenha o mais profundo silêncio,
espere que ele entre na gaiola.
Depois que entrar,
feche lentamente a porta com o pincel.
Aí então apague uma por uma todas as varetas.
(Cuidado para não esbarrar em nenhuma pena do pássaro.)
Finalmente pinte a árvore, reservando o mais belo de seus ramos
ao pássaro.
Pinte também a verde folhagem e a doçura do vento,
a poeira do sol, o rumorejo dos bichinhos da relva no calor da estação.
Depois aguarde que o pássaro se decida a cantar.
Se ele não cantar,
mau sinal:
sinal de que o quadro não presta.
Mas bom sinal, se ele canta:
sinal de que você pode assinar o quadro.
Então retire suavemente uma pena do pássaro
e escreva o seu nome a um canto do quadro.
sinal de que o quadro não presta.
Mas bom sinal, se ele canta:
sinal de que você pode assinar o quadro.
Então retire suavemente uma pena do pássaro
e escreva o seu nome a um canto do quadro.
Ri !
ResponderExcluirObrigada por dividir conosco algo tão belo e suave !
Que possamos sempre ouvir o canto dos pássaros !
Pássaros também são poemas...
ResponderExcluir"Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo como de um alçapão. Eles não têm pouso nem porto; alimentam-se um instante em cada par de mãos e partem.
E olhas, então, estas tuas mãos vazias, no maravilhoso espanto de saberes que o alimento deles, já estava em ti..." Quintana.
Olá, Ricardo !
ResponderExcluirAgradecemos por mais esta leitura que, como sempre, nos leva a reflexões e a nos conectarmos com a nossa alma.
E o Pássaro nos diz muito mais com o seu vôo, seu canto, suas asas e sua liberdade , símbolo exato e perfeito que e'.
Assim voando surgiu este Pássaro em desejo, em seguida pintado em tela, num poema e ,finalmente há poucos anos, em outra tela e desta vez glorioso e vivaz.
Trouxemos o poema, hoje melhor compreendido com a nova introspecção :
CANTO DO PÁSSARO CATIVO
Muito além do urbano muro
floresce reservada a floresta.
Vegeta e pulsa o viver seguro
longe da agitação que nos resta.
Quem cativa o sabia'
ouve o gorjeio de lá.
Chega o filho do maltrato,
serra em punho, venda a vista,
cobiçando um bom contrato
bem ao gosto calculista.
Corre e serra o aço impune
ferindo o lenho nobre
que a ave ao mundo une.
E nao há ninho que sobre.
Treme e fulge a serra em ronco.
Trina e foge a avezinha.
Tombam copa, galhos, tronco,
que os membros do homem espezinha.
Recorta o todo em retalho
banhado de seiva e dor.
Só testemunha o orvalho
que cobre a relva em frescor.
Raiz de sono desperto,
pena sem culpa, extração,
impõem a terra o peito aberto
da secular germinação.
Segredos mortos e expostos
do vegetal sem história,
as aves, em outros postos,
têm saudade... ou memória.
Quem cativa o sabia'
ouve o gorjeio de lá.
Dulce Moron
( 1987 )
Então, ... embora pareça tratar-se mais de ecologia, percebi a inserção da
alma / pássaro no mundo, inseparável deste, aprendendo crescer e voar, tanto no seu habitat como fora e acima dele, quando possível.
Assim liberta-se o sabia' do cativeiro pessoal. Transcender e' preciso.
Abraços e gratidão,
Dulce Moron