sexta-feira, 5 de maio de 2017

O MELHOR POSSÍVEL

Por Maria Júlia Paes da Silva – juliaps@usp.br
Fragmento da obra: "No caminho - Fragmentos para ser o melhor"


Quando resolvemos ser o melhor possível, podemos deixar que as coisas e os outros sejam o que conseguirem ser ou deixar de gastar energia tentando fazer que os outros sejam aquilo que eu imagino seja o melhor. Se somos conscientes do compromisso de sermos o melhor de nós mesmos a todo instante, tomamos as decisões com esse foco e não ficamos perdidos em elucubrações de: e se... e se... Economizamos energia. Motivo pelo qual é verdade que se um relacionamento tiver que ser segredo, é melhor não entrar nele. Ou sair rapidinho.
Só porque o caminho do autoconhecimento é longo, constante e árduo, deveríamos deixar de trilhá-lo? Será que somos menos capazes que um bebê? Todos nós já fomos bebê e deveríamos ter suficiente prática em levar tombos!
Auto-observação é autocorreção. Teve uma doença grave? Faça controle periódico e toque a vida. Tem uma doença crônica? Faça os controles necessários e curta a vida!
A construção de nossa história deve/pode nos confortar. Reconhecer que fez o melhor possível em determinado momento não significa que faria novamente o que fez, hoje. Significa apenas que fomos tomando consciência de algumas coisas e refazendo escolhas a partir de nossas necessidades, miopia, ilusão e recursos.
Responsabilizarmo-nos pela vida que há em nós é fundamental para vivermos no presente e para fazermos o melhor possível...
Peter Senge e sua equipe afirmam que "transferência de responsabilidade" é uma estrutura sistêmica arquetípica, quando as pessoas agem para amenizar os sintomas de um problema e acabam se tornando mais e mais dependentes dessas soluções sintomáticas. Por exemplo: tomar duas aspirinas para aliviar a dor de cabeça parece adequado, mas... Se a origem dessa dor for o estresse do trabalho ou compromissos assumidos além de nossa capacidade ou habilidade, continuar tomando aspirinas não é resolutivo! Nesse caso, uma intervenção como essa pode mascarar um desafio mais grave. Não enfrentar o desafio real só fará piorá-lo. Se o padrão que gerou o desconforto não for corrigido, além do excesso de trabalho, pode-se ainda criar um problema de dependência medicamentosa...
Esse aspecto precisa ser recordado porque é um padrão insidioso e comum em uma sociedade que exige soluções rápidas para questões complicadas e complexas. E, por ser comum, essa dinâmica de transferência de responsabilidade passa despercebida. Nós somos os responsáveis por nossa vida!
As duas abordagens "soluções sintomáticas" e "soluções fundamentais" não são mutuamente exclusivas, até porque a vida é complexa! Mas é fácil transferir a responsabilidade para soluções tecnológicas e, assim, reduzir o desenvolvimento de nossas habilidades e capacidades. Por exemplo: com a calculadora, esquecemos a aritmética; com o carro renunciamos ao caminhar; com o Whatsapp, não conversamos pessoalmente; com a internet, se reduziram as conversas entre familiares e o "olho a olho" (até remédio em excesso é veneno!).
É necessário cultivar os hábitos, as posturas, os comportamentos, os sentimentos que desenvolvem nossa capacidade de sermos humanos! De sermos o melhor de nós.
Muitos dos desafios mais prementes de hoje, como danos ambientais e desigualdade no acesso à tecnologia, surgem como efeitos colaterais de longo prazo do processo de transferência de responsabilidade, criando novos sintomas do problema, que requerem, por sua vez, novas respostas tecnológicas. É necessário refletir o quanto é adequado ou nocivo, apesar de mais fácil, comprar um carro maior para nos sentirmos mais seguros, em vez de aprendermos a nos entender uns com os outros a fim de gerarmos mais segurança para todos. A maioria de nós não tem ideia de nossa capacidade para aprimorar as qualidades que realmente valorizamos na vida.
Hoje em dia, definimos o progresso basicamente por novas conquistas em tecnologia e não por uma noção mais ampla de melhora no bem estar! Fazer o melhor possível é um "chamado", uma oportunidade para nos entregarmos a algo maior que nosso ego e a nos tornarmos aquilo que deveríamos e podemos ser.
Lavarmos as mãos mesmo quando ninguém está olhando. Cumprirmos com horários e prazos combinados, sem inventarmos "imprevistos" (se não tiver um, claro!). Assumirmos o quê e como dissemos algo, pedirmos desculpas quando errarmos, sermos honestos com nossas intenções... Parecem tão simples essas ações, mas que Maria entendeu que a base de qualquer trabalho consigo mesmo é uma consciência limpa. Consciência limpa permite que harmonizemos razão e coração, e por isso viver em harmonia começa conosco, não com o mundo à nossa volta.


Maria se lembrava da história de um homem muito crente, que todo dia pedia a Deus que lhe indicasse o que deveria ser feito. Um dia, por ele ter tanta fé, Deus lhe apareceu e pediu que empurrasse, diariamente, a grande pedra que havia em frente à sua casa. Ele fez isso todos os dias, com alegria, anos a fio, mas foi percebendo que a pedra não se movia nem um só centímetro. A fé do homem foi esmorecendo, sua vontade diminuindo, até que um dia Deus lhe apareceu novamente e lhe perguntou o que estava acontecendo. Ele lhe disse que a pedra não havia se movido um centímetro, apesar de, diariamente, ele a ter empurrado! Deus sorriu e lhe disse que sua intenção não era mover a pedra, mas torná-lo forte! Que ele prestasse atenção a como estavam seus músculos e sua força.

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