quinta-feira, 6 de agosto de 2015

SIMETRIA V – CONFLUÊNCIA E GÊNESE



Estou a ler obra em que o gigante Jacob Boehme (1575 - 1674) é revisitado pelo físico romeno Basarab Nicolescu. Leitura interessante ao observador da ciência contemporânea enquanto ecos de outros tempos. Tempos que apesar de passado para alguns, gesta a atualidade dos modelos presentes, contudo sem perder a poesia, ou aquele espaço de mistério que se afasta quanto mais o buscador se aproxima e que se aproxima quanto maior a reverência do mesmo. E se o buscador não for mercador, tanto melhor...

O fragmento a seguir ressoa com esse caminhar palindrômico em meio a vales e penhascos rumo ao reino de simetria. Senão vejamos:

“Se a primeira vontade é um Sem-fundo (ungrund), que deve ser considerado como um eterno Nada, então a consideraremos como um espelho no qual todas as coisas veem a própria imagem semelhante a uma vida; no entanto não há vida alguma, mas uma figura e uma imagem da vida.
Assim, reconhecemos o eterno Sem-fundo (ungrund), fora da Natureza, como um espelho, pois ali ele é semelhante a um olho que vê, mas nada do que vê pode levá-lo a aprender ou realizar o que é visto, pois a visão é sem essência, isto é, da vida essencial.
Desse modo, torna-se evidente que o eterno Sem-fundo fora da Natureza é uma Vontade, semelhante a um olho, em cujo interior está oculta a Natureza, como um fogo oculto que não arde, que existe e não existe ao mesmo tempo. Não é um espírito, mas uma forma de espírito, semelhante a um reflexo no espelho. Ali todas as formas de espírito podem ver-se como reflexos no espelho; no entanto o olho vê apenas o próprio espelho, vê somente a si mesmo, pois seu ver é em si mesmo, e nada há diante dele que seja mais profundo que ele mesmo. Semelhante a um espelho, é o contenedor da face da Natureza; no entanto ele não toca a Natureza, assim como a Natureza não toca a forma da imagem no espelho.
Assim, um está livre do outro, e contudo o espelho é o contenedor da imagem. De fato, o espelho abarca a imagem, e contudo é impotente em relação a ela, uma vez que não pode reter o reflexo da imagem. Pois se a imagem se afasta do espelho, o espelho é então um brilho vazio. E seu brilho é um nada; contudo todas as formas da Natureza estão ocultas em seu interior como um nada, que todavia é verdadeiro, mas não em essência...
... Assim, concebemos o seguinte: O que e como foi a eternidade antes da criação deste mundo. O que a Essência Inominável é em si mesma, sem Princípio ou Fundo. O que é o Eterno Início no Sem-fundo e como, em sua eterna finalidade, engendra em si um Fundo, um centro para a Palavra, seu próprio centro. Como a eterna geração da Palavra na Vontade, no espelho da Sabedoria eterna, na Virgem, ocorre incessantemente desde toda eternidade sem nada engendrar e por nada sendo engendrada.
Nessa Virgem da Sabedoria do Inominável, o princípio eterno é como um fogo oculto que reconhece sua cor no espelho da Sabedoria. Desde a eternidade ele [o princípio eterno] foi conhecido em imagem ou figura [no espelho da Sabedoria], e assim será refletido e reconhecido por toda a eternidade, através de sua eterna origem no espelho virginal da Sabedoria.
Nesse espelho em que o princípio é manifesto a partir do Sem-fundo, a essência dos Três Princípios foi vista com suas maravilhas conforme a semelhança da Santa Trindade, numa insondável profundidade, e isso desde a eternidade.”

  

2 comentários:

  1. Na minha compreensão ao ler este texto, indago que o ser humano é uma casca vazia no seu interior, apenas construído por inúmeras células com o poder de raciocínio limitado, dado os fatos ao seu redor. A questão de não conhecer sua existência, o faz como a imagem infinita de um espelho.

    Alberto Antoni

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    1. Legal Alberto!

      Um infinito em potencial ou talvez uma poesia viva!

      Sejamos pois...

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