Por: Renata Ferraz Torres – Psiquiatra e Analista Junguiana.
Vai aqui uma pequena reflexão a respeito daquilo que sentimos ser mais
pesado dentro de nós. Qualquer pessoa, ao fechar os olhos e se interiorizar, é
capaz de lembrar-se de algo lamentável e pesaroso, a respeito do que se
arrepende ou faria dessa vez de forma diferente, caso fosse possível voltar
atrás e reviver.
Os chamados alquimistas, que podem ser remontados desde Egito Antigo até
Europa Medieval, dedicavam-se a transformar chumbo – aquilo que é mais pesado,
o menos precioso dos sete metais – em ouro: algo brilhante, valioso, digno de
orgulho.
O psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875 – 1961) dedicou-se ao estudo da
alquimia como uma comparação metafórica do caminho do autoconhecimento.
Denominou “processo de individuação” a ampliação de consciência possível a um
ser humano dedicado a essa difícil empreitada, que consiste em descolar-se do
instinto e das forças do inconsciente e construir um forte eixo entre
consciente e inconsciente. Através dessa laboriosa jornada, consciente e
inconsciente passariam a se comunicar de forma especial e facilitada. Tal
caminho pode ser alcançado, por exemplo, através da dedicação à análise de
sonhos (dentro de uma psicoterapia ou através de autoanálise, desde que corretamente
conduzida).
Reconhecemos as pessoas que estão nesse caminho da individuação como
aquelas que não só envelhecem com o decurso do tempo, mas tornam-se sábias.
O trabalho interior corresponde a tentar transformar aquilo que é mais
pesado em algo mais valioso, mais brilhante, melhor. Além disso, consiste
também em aceitar e acolher aquele chumbo que também talvez não consigamos
transmutar em ouro. Isso porque existem coisas que não serão possíveis de
mudar. Sobretudo o passado.
A psicoterapia se dedica a ressignificação do passado, isso é, ter uma
compreensão especial a respeito do que já foi. Acolher o passado, aceitá-lo,
transformar as lembranças traumáticas que trazemos conosco, e que podem
constituir-se como uma bagagem bastante pesada caso não façamos um trabalho
interior. Apenas através da ressignificação é que o passado pode ser
transformado, e com isso podemos entrar num verdadeiro “túnel do tempo” e assim
nos visitar no passado. Aceitar e perdoar quem fomos ontem, de modo a nos
libertar no presente e ampliar o leque de quem somos hoje e podemos ser amanhã,
no futuro.
PLANETA SATURNO - IMAGEM REAL |
Na astrologia o chumbo é representado pelo planeta Saturno, o senhor do
tempo. Em algumas tradições Saturno é chamado, ao lado de Plutão, um dos “planetas
malignos”. Isso porque ele aponta em nosso mapa astral o lugar da fragilidade,
da deficiência, da dor e da dificuldade. Porém, nos mostra também aonde,
empreendendo um sério e profundo trabalho interior, podemos nos tornar mestres.
A astróloga Liz Greene aponta que Saturno “não é simplesmente um símbolo de
dor, de restrição e de disciplina, mas também um símbolo do processo psíquico,
comum a todos os seres humanos, por meio do qual um indivíduo poderá utilizar
as experiências de dor, de restrição e de disciplina como um meio de ampliar
sua consciência e seu desempenho”.
Aonde somos Saturno é o lugar a partir do qual a maior superação e
transcendência é possível, em termos de quilometragem de percurso percorrido
entre o início e o fim da caminhada. Aonde somos ouro (signo solar) cabe luzir
e brilhar, nesse aspecto já somos mestres. O signo e/ou aspectos relacionado(s)
a Saturno é aonde, para luzir e tornarmo-nos mestres, teremos que trabalhar
muito.
Quero aqui fazer um elogio à Saturno. Ao invés de olharmos para ele como
um “maligno”, creditemos a esse mestre espiritual o quinhão que merece. No
final das contas, ser ou não um sábio deve ter mais relação com quanto
trabalhamos nosso chumbo, e não o ouro originalmente recebido.
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