Continuação de: Sexualidade e Saúde I
No último mês, os paulistanos
foram presenteados com uma bela imagem na decoração de seus relógios de rua,
uma mocinha com sutiã e calcinha e face enigmática alternando com o comercial
de um medicamento para dor, ambos em tons avermelhados. Sem querer negar a
profundeza da imagem angelical assim como a competência do propagandista, me
passou o pensamento “impuro” sobre como a questão é delicada, especialmente
aqui no Gigante deitado eternamente em berço esplêndido ao som do mar e à luz
do céu profundo.
Algumas
vezes no estrangeiro pude notar a ideia que os irmãos humanos de outros países
fazem do feminino brasileiro, cá entre nós melhor nem saber! Penso que a questão
da sexualidade e sua exploração midiática é tema que deve ser atentado ao menos
pelos que caminham em busca de sentido.
De fato, Freud (não é
Frôdo (senhor dos anéis) não, leia-se Fróide) e seu sobrinho Bernays, conforme
explorado no intrigante documentário inglês - “O Século do Self”, são experts no tema. Quando Freud explora conceitualmente
a ideia de libido, abre-se precedente para experimentalmente testar seu
fundamento prático. Os autores exploram a ideia genial e bombástica de que a
libido, enquanto atributo humano poder ser direcionada pelo seu portador (mundo
interior), mas também por estímulos vindos do mundo exterior!
Freud explora de forma
perseverante a ligação da libido com o impulso sexual do humano. Seus
sucessores, como Carl Jung (veja-se Iungui), ousaram apontar que a libido
poderia ser dirigida não apenas para baixo (criatividade pelo sexo), mas também
para cima (criatividade pelo cérebro), associando à libido a capacidade
criadora do humano. Na verdade, que a libido agia naturalmente de modo
ascendente, já era de algum modo conhecido desde há muito na antiguidade ao se
castrar meninos (Castrati) para que suas vozes não engrossassem e pudessem
continuar a cantar em certa afinação mesmo após a puberdade.
Veja: Sobre Castrato
Agora o humano podia
criar a partir da libido – relação sexual – outro ser; e poderia criar a partir
da libido – relação intelectual – outra realidade. Pergunto-me com frequência:
poderia uma nação excessivamente culta sexualmente o ser intelectual e
criativamente? Uma sentença para cada cabeça, a de cima e a de baixo,
contingências dependentes dos usuários, eventualmente dos usurários.
Enquanto isso, no outro
lado do mundo, em curiosa matéria no New York Times sobre uma série no canal “agá
bê ô”, o repórter mostra surpresa ao relatar cenas de incesto e estupro
meticulosamente programadas pelos personagens!
Ao que tudo indica, seja
na moça de calcinha e sutiã nos aparelhos que mostram propagandas e hora pregados em canteiros,
às vezes na mesma rua a cada cem metros, seja nos canais de formação de
sensações e opiniões, essa questão da libido e sua estimulação é relevante e pede
um olhar das autoridades de Saúde.
Uma devassa nesse sentido seria bem vinda, mas uma devassa - averiguação - não aquela outra - libertina - e muito menos aquela terceira, que aparece depois da mocinha e que atrofia o cérebro.
Acredito que utilizar a
sexualidade como estímulo ao motor social, nada contra, deve ser feito com uma
pitada a mais de parcimônia por parte dos gestores. Tudo o que optamos por usufruir
sustenta a cadeia desde a ideia semeada até a propaganda manifesta em imagem.
Imaginação é imagem em ação; a imagem deve ser antes colocada em ação
interiormente; hoje se sabe que a imagem em ação exterior interfere no processo
de criação de imagens interiores e conduz e induz mesmo aqueles de nós mais bem
intencionados...
A falta de sentido interior
é mãe da ânsia por preenchimento com exterioridades. Os buracos dos sapatos e
das bolsas são respostas irmãs aos “fálicos” automóveis e cartões de crédito assim como aos
anseios de uma sociedade que se afastou de seu fundamento existencial. Como não bastasse, brotam ainda vícios e ambições desmedidas a sedar
ainda mais os sentidos; consciência, só em último caso, porque é chato e dói. Assim,
enquanto reina a falta de disposição para o sacrifício (ofício sagrado – sacro ofício),
que o sofrimento nos auxilie a reencontrar o caminho!
Concordo e complemento:
ResponderExcluirSanto Agostinho (354-430) em "Confissões", fala sobre o perigo da curiosidade na vida de quem busca o encontro com a espiritualidade (Livro VI, cap. 8)
"Não querendo por nada deixar a carreira mundana, tão decantada por seus pais, partira
antes de mim para Roma, a fim de estudar Direito; lá se deixou arrebatar de modo incrível, e com
incrível avidez, pelos espetáculos de gladiadores.
A princípio, detestava e aborrecia espetáculos semelhantes. Certa vez, encontrando-se
com alguns amigos e condiscípulos que voltavam de um jantar, apesar de resistir, foi arrastado
por eles com amigável violência para o anfiteatro, onde naquele dia se celebravam jogos funestos
e cruéis.
Ele recusava com veemência, e resistia, dizendo: “Mesmo que arrasteis para lá meu corpo, e o retenhais ali, podereis por acaso obrigar minha alma e meus olhos a contemplar tais espetáculos? Estarei ali como ausente, e assim triunfarei deles e de vós”. Mas eles, não fazendo caso de tais palavras, levaram-no, talvez para verificar se poderia ou não cumprir a palavra.
Quando chegaram, ocuparam os lugares que puderam, pois todo o anfiteatro já fervia nas
paixões mais selvagens. Ele, fechando a porta dos olhos, proibiu que sua alma se envolvesse
em tal crueldade. E oxalá também tivesse tapado os ouvidos! Porque, em um lance da luta, foi tão
grande o clamor da multidão que, vencido pela curiosidade, e julgando-se preparado para
desprezar e vencer a cena, fosse o que fosse, abriu os olhos. Foi logo ferido na alma mais
profundamente do que a ferida física do gladiador a quem desejou contemplar e caiu. Sua queda
foi mais miserável que a do gladiador, causa de tantos gritos. Estes, entrando-lhe pelos ouvidos,
abriram-lhe os olhos, para ferir e abater sua alma, mais temerária do que forte, e tanto mais fraca
por apoiar-se em si mesma, em lugar de se apoiar em ti. Logo que viu sangue, bebeu junto a
crueldade, e não se afastou do espetáculo; pelo contrário, prestou mais atenção. Assim, sem o
saber, absorvia o furor popular e se deleitava naquela luta criminosa, inebriado de sangrento
prazer.
Já não era o mesmo que ali viera, era agora mais um da turba à qual se misturara, digno
companheiro daqueles que para ali o arrastaram.
Que mais direi? Contemplou o espetáculo, gritou, apaixonou-se, e foi contaminado de
louco ardor, que o estimulava a voltar, não só com os que o haviam levado, mas à sua frente, e
arrastando a outros. Mas tu te dignaste, Senhor, livrá-lo deste estado com mão forte e
misericordiosa, ensinando-o a não confiar em si, mas em ti, embora isto acontecesse muito tempo
depois."
Bjs
Maria Inez
Caramba!
Excluirps. Nas linhas acima, ele (Santo Agostinho), narra o caso de seu amigo Alípio.
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