Por: Clara Oliva Antoniazzi - clara.antoniazzi@gmail.com / http://sejamosseres.blogspot.com.br
Continuação de: Ciência Goetheana
Esse capítulo introduz Goethe como cientista através
de seu método de pesquisa. No começo explicarei a ciência de Goethe baseando-me
nos seus próprios textos, em seguida elucidarei sua metodologia através da
interpretação de Nigel Hoffman.
“Você precisa confiar
em seus sentidos:
eles não te mostrarão
nada falso
se sua inteligência
se mantiver acordada.
Mantenha seus olhos puros
e abertos e lépidos,
e mova-se com passos
certos, porém flexíveis,
por entre campos de
um mundo ricamente dotado”
(Goethe, citado em
Nayldler, 1996: 29)
Johann Wolfgang von Goethe nasceu na Alemanha dia 28
de agosto de 1749. É considerado um dos maiores escritores da literatura
moderna, sendo conhecido mundialmente por seu memorável trabalho literário Fausto. Por isso é possível
surpreender-se ao saber que Goethe também era um cientista e que ‘considerou
suas pesquisas científicas seu feito mais significativo’ (Miller, 2009: xvi). Dentre
suas realizações na área da ciência encontramos: a descoberta do osso intermaxilar
no ser humano (o que ajudou a preparar a base para a teoria moderna da
evolução); uma investigação original sobre o processo de crescimento das
plantas; foi o primeiro a usar o termo morfologia
e o primeiro a compreender corretamente a resposta fisiológica normal às cores
(Miller, 1995: xi). Seu trabalho dentro da ciência inclui as áreas de morfologia,
botânica, zoologia, geologia, meteorologia e física, onde ele realizou seu
trabalho científico mais substancial, Teoria
das Cores em 1810 (Miller, 2009: xvi), no qual ele oferece uma alternativa
à visão Newtoniana.
Com o avanço tecnológico e o uso de instrumentos mais
precisos e sensíveis do que o corpo humano no estudo dos fenômenos, a abordagem
mecanicista e reducionista ganha espaço quanto ao modo de apreensão do mundo. Goethe
batalhou contra a maneira pela qual a ciência estava sendo feita na sua época. Ele
não concordava com o pensamento newtoniano mecanicista, com a forma
reducionista de quebrar um sistema em partes e estudá-las cada vez mais
profundamente esquecendo o todo e ignorando o contexto maior. Goethe ‘podia ver
o benefício da observação cada vez mais precisa através do uso de instrumentos,
[mas] ele acreditava que a menos que essas observações fossem reconectadas com
a relação viva humana com a natureza, elas iriam levar ao entendimento
unilateral distorcido do mundo’ (Naydler, 1996: 28). Para Goethe partes e todo
deveriam ser estudas em relação uma com a outra. Ele escreveu: ‘Mentes fracas
cometem o erro mental de pular diretamente do particular para o geral quando,
na verdade, o geral pode ser encontrado somente dentro do todo’ (Goethe, 1995:
307). Ele estava olhando para as partes para encontrar o todo e para o todo
para encontrar as partes; ele estava vendo um todo múltiplo ao invés de partes
diferentes que formariam um tudo ou um todo que poderia ser dividido em partes.
Henri Bortoft, em seu livro “The Wholeness of Nature: Goethe’s Way of Science”
(A Totalidade da Natureza: A Ciência de Goethe), escreve maravilhosamente sobre
a relação entre as partes e o todo:
“O
risco da emergência é tal que o todo depende das partes para poder aparecer e
as partes dependem desse aparecimento do todo para serem significantes ao invés
de superficiais. O reconhecimento da parte só é possível através do ‘surgimento’
do todo” (Bortoft, 1996: 11).
A relação entre partes e todo é um processo dinâmico. Isso
é exatamente o que interessava Goethe: a dinâmica dos sistemas vivos, como o
processo no qual organismos vivos surgem. Mas, como Goethe percebia essa
relação das partes com o todo?
A metodologia científica de Goethe, a qual ele chamou
de empirismo delicado, era baseada em
observação empírica. Ele observava os fenômenos deixando-os falar por eles
mesmos, ignorando o preconceito. Seu objetivo era encontrar o que ele chamava
de Fenômenos Arquetípicos (Ürphänomen), os fenômenos originais, conceitos ou
ideias que podem ser captados através da percepção intuitiva. Goethe descreveu
os fenômenos arquetípicos como ‘ideais, reais, simbólicos, idênticos. Ideais
como o conhecimento máximo que podemos ter; reais como aquilo que podemos saber;
simbólicos porque incluem todas as instâncias; idênticos a todas as instâncias’
(Goethe, 1995: 303). Para ele o limite da nossa percepção é quando reconhecemos
os fenômenos arquetípicos. Ele acreditava que é um erro tentarmos ir além dos
Ürphänomen já que a partir deles é possível tornar tudo o que foi observado
inteligível.
‘O máximo que alguém pode alcançar é maravilhar-se.
Quando o Fenômeno Arquetípico faz alguém maravilhar-se, que esse alguém fique
contente. Não é possível permitir-se uma experiência além disso, e buscar algo
mais é fútil. Aqui está o limite. Mas é regra as pessoas não se satisfazerem
com a contemplação de um Fenômeno Arquetípico. Elas acreditam que deve ter algo
além. Elas são como crianças que, ao olhar para um espelho, viram-no para ver o
que é que tem do outro lado’ (Goethe, 1996: 109).
Goethe considerava os Fenômenos Arquetípicos divinos, núcleo
essencial que faz o fenômeno ‘ser o que é e o que se torna’ (Seamon, 1998: 4). Ele
acreditava que a maneira de captar os Ürphänomem é vivê-los em uma experiência
pura, tentando racionalizar o menos possível, mas ao mesmo tempo não esquecendo
a teoria. Ele queria entender fato e teoria juntamente. ‘A meta suprema é:
captar que tudo no domínio dos fatos já está lá. O azul do céu nos mostra a lei
básica da cromática. Permita-nos não buscar algo além dos fenômenos – eles
próprios são a teoria’ (Goethe, 1995: 307).
Em seu artigo “Goethe, Nature and Phenomenology”
(Goethe, Natureza e Fenomenologia), David Seamons argumenta que a metodologia
goethiana era incomum para sua época, uma vez que focava em observações
qualitativas, sendo por isso seus estudos rejeitados pela ciência convencional.
Com a atual articulação filosófica da fenomenologia, seus escritos podem ser melhor
compreendidos (Seamons, 1998: 1). Fenomenologia é a ciência que estuda
fenômenos com foco na percepção humana: seu intuito central é ‘a própria coisa’
como diria Edmund Husserl, seu idealizador. Em outras palavras, ‘fenomenologia
é a exploração e descrição de fenômenos, onde os fenômenos são coisas ou
experiências da forma que os seres humanos as experienciam’ (Seamons, 1998: 2).
A metodologia científica goethiana, o empirismo delicado, era baseada no uso
dos sentidos humanos e na percepção intuitiva, os quais ele considerava os maiores
instrumentos científicos. Essa abordagem é encontrada em suas palavras:
“Meu
pensamento não é separado de objetos; os aspectos do objeto, a percepção do
objeto fluem em direção ao meu pensamento e estão totalmente permeados por ele;
[...] minha percepção é ela própria um pensamento, e meu pensamento uma
percepção. [...] O ser humano conhece ele mesmo somente na medida em que
conhece o mundo; ele percebe o mundo apenas nele mesmo, e ele mesmo apenas no
mundo” (Goethe, 1995: 39).
Nesse sentido é possível dizer que Goethe era um
cientista fenomenológico antigo. Portanto, Goethe estava vendo a relação entre
partes e todo através de uma abordagem fenomenológica do mundo a fim de
entender os Fenômenos Arquetípicos. Ele estava usando diferentes formas de
conhecimento, mudando do pensamento racional para percepção intuitiva, unindo o
intelectual com o imaginativo, o científico com o artístico, ele estava
misturando modos mentais para poder entender melhor a Natureza.
ate aqui tudo bem, ou como diria goethe; a natureza sem rogar e aem prevenir nos acolhe no circuito de sua dansa
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