Estou a ler obra em que o
gigante Jacob Boehme (1575 - 1674) é revisitado pelo
físico romeno Basarab Nicolescu. Leitura interessante ao observador da ciência
contemporânea enquanto ecos de outros tempos. Tempos que apesar de passado para
alguns, gesta a atualidade dos modelos presentes, contudo sem perder a poesia,
ou aquele espaço de mistério que se afasta quanto mais o buscador se aproxima e
que se aproxima quanto maior a reverência do mesmo. E se o buscador não for
mercador, tanto melhor...
O fragmento a seguir
ressoa com esse caminhar palindrômico em meio a vales e penhascos rumo ao reino
de simetria. Senão vejamos:
“Se
a primeira vontade é um Sem-fundo (ungrund),
que deve ser considerado como um eterno Nada, então a consideraremos como um
espelho no qual todas as coisas veem a própria imagem semelhante a uma vida; no
entanto não há vida alguma, mas uma figura e uma imagem da vida.
Assim,
reconhecemos o eterno Sem-fundo (ungrund),
fora da Natureza, como um espelho, pois ali ele é semelhante a um olho que vê,
mas nada do que vê pode levá-lo a aprender ou realizar o que é visto, pois a
visão é sem essência, isto é, da vida essencial.
Desse
modo, torna-se evidente que o eterno Sem-fundo fora da Natureza é uma Vontade,
semelhante a um olho, em cujo interior está oculta a Natureza, como um fogo
oculto que não arde, que existe e não existe ao mesmo tempo. Não é um espírito,
mas uma forma de espírito, semelhante a um reflexo no espelho. Ali todas as
formas de espírito podem ver-se como reflexos no espelho; no entanto o olho vê apenas o próprio espelho, vê
somente a si mesmo, pois seu ver é em si mesmo, e nada há diante dele que seja
mais profundo que ele mesmo. Semelhante a um espelho, é o contenedor da face da
Natureza; no entanto ele não toca a Natureza, assim como a Natureza não toca a
forma da imagem no espelho.
Assim,
um está livre do outro, e contudo o espelho é o contenedor da imagem. De fato,
o espelho abarca a imagem, e contudo é impotente em relação a ela, uma vez que
não pode reter o reflexo da imagem. Pois se a imagem se afasta do espelho, o
espelho é então um brilho vazio. E seu brilho é um nada; contudo todas as
formas da Natureza estão ocultas em seu interior como um nada, que todavia é
verdadeiro, mas não em essência...
...
Assim, concebemos o seguinte: O que e como foi a eternidade antes da criação
deste mundo. O que a Essência Inominável é em si mesma, sem Princípio ou Fundo.
O que é o Eterno Início no Sem-fundo e como, em sua eterna finalidade, engendra
em si um Fundo, um centro para a Palavra, seu próprio centro. Como a eterna
geração da Palavra na Vontade, no espelho da Sabedoria eterna, na Virgem,
ocorre incessantemente desde toda eternidade sem nada engendrar e por nada
sendo engendrada.
Nessa
Virgem da Sabedoria do Inominável, o princípio eterno é como um fogo oculto que
reconhece sua cor no espelho da Sabedoria. Desde a eternidade ele [o princípio
eterno] foi conhecido em imagem ou figura [no espelho da Sabedoria], e assim
será refletido e reconhecido por toda a eternidade, através de sua eterna
origem no espelho virginal da Sabedoria.
Nesse
espelho em que o princípio é manifesto a partir do Sem-fundo, a essência dos
Três Princípios foi vista com suas maravilhas conforme a semelhança da Santa
Trindade, numa insondável profundidade, e isso desde a eternidade.”
Na minha compreensão ao ler este texto, indago que o ser humano é uma casca vazia no seu interior, apenas construído por inúmeras células com o poder de raciocínio limitado, dado os fatos ao seu redor. A questão de não conhecer sua existência, o faz como a imagem infinita de um espelho.
ResponderExcluirAlberto Antoni
Legal Alberto!
ExcluirUm infinito em potencial ou talvez uma poesia viva!
Sejamos pois...