OPERÁRIOS - TARSILA DO AMARAL 1933 |
Dr. Ricardo,
Caro amigo de partilha
Neste dia do trabalho, não há como não lembrar da abertura dos discursos
do então presidente da República Getúlio Vargas: “Trabalhadores do Brasil!”,
enfatizando a nova classe surgida com a Revolução Industrial implementada e, em
expansão no Brasil com o incremento de indústrias fabris, então chamadas de
fábricas, onde a mão de obra originária era então denominada Trabalhadores.
Como tais, eram, a partir de então, remunerados com salários.
Com essa nova classe vem em seu bojo, o salário mínimo, os
direitos trabalhistas, cuja consolidação data de 1943, sob os auspícios do
governo Vargas, e tantas outras aspirações que vieram a se concretizar, com a
implantação dos Sindicatos, cujos membros diretivos, indicados pelo próprio governo
eram pejorativamente chamados de “pelegos”, por atuarem em consonância com o
governo e a classe patronal.
Na roda viva do tempo, estabeleceu-se, a partir de então, o 1o
de Maio, em comemoração ao Dia do Trabalho, oportunidade em que os
trabalhadores aproveitavam para promover junto ao governos municipal, estadual e
federal as suas reivindicações mais imediatas e prementes, em prol de melhores
condições de trabalho e salário.
Mas, a roda viva não para. As condições se modificam e muitas
vezes não dignificam, antes, pioram, principalmente com o advento e expansão em
escala crescente do funil do “Mercado”
em que tudo é arrastado e avaliado, fazendo com que os direitos adquiridos
sejam acintosamente deixados de lado e outros, advindos com a nova situação,
não sejam implementados como legislação a ser exercida e cumprida.
Com isso perdeu-se as estribeiras, os parâmetros foram
degringolados em favor de interesses os mais diversos, porém eminentemente escusos
do lucro e da ganância sem fim. Nesse patamar, as fábricas fecharam ou se
juntaram a outras para formar os grandes conglomerados de empresas,
abastecidas em grande parte não só do lucro mas ainda do dinheiro público. Afinal,
os dirigentes do governo só o são graças as grandes benesses recebidas, num
jogo aberto de “toma lá, dá cá”, sem fim.
Nessa onda, o trabalhador amesquinhou-se e perdeu-se no emaranhado
de interesses, substituídos por máquinas, informatização, especialistas,
executivos e, em última instância, meros prestadores de serviço. Por outro
lado, os dirigentes sindicais, tornaram-se afilhados dos governos, seus apoiadores
ou até mesmo partícipes: como prefeitos, vereadores, deputados senadores, ou,
até mesmo, presidentes de partidos ou da Pátria, quando ufanamente dizem-na “amada
e idolatrada”. Por sua vez, os governos tornaram-se meras massas de manobras
com fins de salvaguardar interesses próprios e imediatos de natureza eletiva,
em grau desproporcional eleitoreiro e populista, num projeto apenas de poder.
Mesmo assim, ele ainda poderá gabar-se e agigantar a razão:
“De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
O operário em Construção”
Vinicius de Moraes, in “O
Operário em Construção”
O Dia do Trabalho, - sem trabalhadores -, transformou-se num mero
projeto de poder, agora com sua programação determinada pelas CGT e CUT que – quer
queiram ou não – tornaram-no mera data de entretenimento, sem qualquer
vinculação social, econômica ou política, com os trabalhadores, apenas com uma
farta distribuição de prêmios, como qualquer programa de auditório ou show de megaevento,
recheado de luzes, pirotecnia e muito barulho por nada.
E assim, como “La Nave Vá” singrando mares recheados de esgotos à
céu aberto, saúde em pânico, mortes à granel, infância abandonada, preconceitos
em ascensão, higienização humana, e democracia claudicante, etc., etc. etc.
É lógico que dirão todos, ou talvez a maioria: esse é um quadro,
de uma visão passadista, pessimista, azeda, perplexa. E é, de fato tudo isso,
mas não se pode dizer que não seja real: os índices e pesquisas estão aí para
quaisquer confirmações.
Mas a matéria é bastante pertinente, basta lembrar que a
dignificação do trabalho e do seu sujeito, o trabalhador, ou o mero prestador
de serviço, não faz jus a sua inserção na pauta: “saúde é consciência”, pois o
amparo pela legislação trabalhista, ainda que defasada no tempo e espaço, faz
parte de um campo mais amplo e geral, constituindo a “saúde social, cujos
meandros insere-se primordialmente à vida, finita, dura, trágica, mas “Vida”:
“E não há melhor resposta/
que o espetáculo da vida:/
vê-la desfiar seu fio/
que também se chama
vida,/ ver a fábrica
que ela mesma,/
teimosamente, se
fabrica, vê-la
brotar como há pouco/em nova
vida explodida.
Morte e Vida Severina – Trecho –,
de João Cabral de Melo Neto.
Feliz Dia do Trabalho a todos.
Mário Inglesi
Caro Sr. Mário,
ResponderExcluirSeu emaranhado de letrinhas resume com a bondade peculiar muito do que observo hoje. Lendo sua reflexão, o quadro de Tarsila ganhou um sentido inusitado...
Não tendo o que acrescentar, visto sua análise cirúrgica da situação, apelo aos universitários na figura de uma pós-graduanda em artes pela UNESP, que em 2012 teceu uma pérola sobre a obra de Portinari: Os trabalhadores do Café; onde pude me deleitar com considerações que fazem eco em qualidade reflexiva às suas. No caso de interessar, deixo aqui o link da preciosa dissertação:
http://www.ia.unesp.br/Home/Pos-graduacao/Stricto-Artes/dissertacao---hebe-de-camargo-bernardo.pdf
Um abraço com a gratidão do aprendiz
Olá Boa tarde!
ResponderExcluirSábias palavras e observações.
Também não tenho o que acrescentar.
Almejo que o ser humano consiga e queira evoluir.
Tudo se tornaria mais suave, com a bondade e justiça divina.
Obrigada.