Por Maria Júlia Paes da Silva – juliaps@usp.br
Fragmento da obra: "No caminho - Fragmentos para ser o melhor"
Maria, por trabalhar na área de
saúde, viu muitas incisões, feridas, machucados e lesões. E também por
trabalhar na área da saúde aprendeu a reconhecer o tecido de cicatrização.
Aprendeu a reconhecer um corpo que mostra que está reagindo e que está se
esforçando para recuperar o próprio equilíbrio e bem estar.
Ela aprendeu a olhar essas
lesões, localizar o tecido de cicatrização (a cura sempre acontece de dentro
para fora!) e, espontaneamente dizer: "Que lindo está ficando isso
aqui!", para, muitas vezes, surpresa dos pacientes e dos seus alunos que a
acompanhavam em sua prática profissional.
Não foram poucos os pacientes
que perguntaram por que "lindo", e ela pôde explicar e partilhar a
beleza expressa na vida se reconstruindo, se reorganizando. Auxiliar os
pacientes a colocar o foco no lado positivo do momento, fortalecendo o belo de
cada situação.
O mundo é uma construção
subjetiva, pessoal! É o reflexo de nossa visão e consciência. Não há momento do
dia em que a meta não possa ser visualizada e o trabalho consigo mesmo levado
adiante.
Não ouvimos tudo o que é dito;
só o que queremos/conseguimos ver. Tudo que lemos não está escrito de verdade;
lemos o que desejamos ler. Nossa visão, audição e leitura são seletivas; nós
escolhemos.
Maria se lembrava de um paciente
que não comia. Deixavam a bandeja com seu prato, o copo de suco e a sobremesa
para que comesse, conforme o usual de um hospital, e o prato quando vinham
buscar, estava intacto. Sempre escreviam, então, que o paciente "recusara
a dieta". Um dia, Maria pediu que um de seus alunos voltasse à enfermaria
e perguntasse ao paciente o motivo de sua recusa, afinal ele estava aprendendo
enfermagem e não havia perguntado se o paciente estava com náuseas, sem
apetite, com dor ou algum outro motivo para que não comesse nada do que lhe era
oferecido. Além do que, já havia registro de uma passagem de plantão de que o
paciente não estava comendo. Para surpresa de todos, ele respondeu que era
porque não tinha dinheiro para pagar pela refeição. Pode parecer óbvio para
alguns de nós que um paciente internado em um hospital público saiba que não se
cobra pela comida, entretanto a vida acaba mostrando que "não tirar
conclusões" pode ampliar nosso mundo.